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Os perigos (e cuidados) de fazer cosméticos em casa

Fazer um cosmético em casa é um ritual ancestral que resgata os saberes artigos, é sustentável, saudável, democrático, honra a natureza e nos conecta com a nossa essência.

Dentro do hábito de fazer o próprio desodorante, esfoliante ou mesmo uma máscara caseira está a liberdade de não concordar com determinada fórmula, preço e mensagem de alguns produtos/marcas e, simplesmente, não precisar deles para viver. Pura independência.

Eu fiz meu primeiro ritual caseiro de beleza antes dos 15 anos e a maioria  dos ingredientes foi colhida na horta de casa ou pinçados da cozinha. Aloe Vera, aveia, mel e água do arroz. Hoje faço, pra mim, do desodorante à máscara capilar. Entusiasta do movimento, recentemente  escrevi uma reportagem para a revista Bons Fluidos (Editora Caras) sobre as novas guardiãs da beleza natural e como esse retorno dos rituais caseiros de beleza está conquistando e empoderando diversos perfis de mulheres. Tantas outras tem surgido na grande imprensa provando que, sim, o movimento se alastrou – ainda bem! A revista Superinteressante (Editora Abril), por exemplo, lançou, há algumas semanas, a série “Minha Vida sem Cosméticos”. Nela, uma repórter passa duas semanas vivendo apenas com itens artesanais. Quando iniciamos o Workshop Slow Beauty (aNaturalíssima + Acorda Bonita + Sublime Rituais) em janeiro desse ano, as turmas lotaram, pois quase não havia eventos do tipo. Atualmente, não passo uma semana sequer sem receber o convite para uma nova vivência. As pessoas realmente estão interessadas em iniciar uma jornada natural – viva!

Por qual motivo, então, levanto a questão de quê fazer um cosmético em casa é tão perigoso? Porque a passo que essa ideia se populariza, muitos conceitos se banalizam. Sobram receitas, faltam reflexões. Perigo para a essência do movimento natural/slow e também para a nossa saúde.

Perigo I: querer milagre, ter zero aceitação


Sem aceitação e consciência, não há máscara com óleo de rosa mosqueta que resolva

Sem aceitação e consciência, não há máscara com óleo de rosa mosqueta que resolva


Sem consciência (e paciência e aceitação), ao adotar  um cosmético artesanal desejando a performance de um item convencional, há o risco de se decepcionar. Porque? Uma fórmula natural não vai trazer resultados instantâneos para estrias e manchas, por exemplo. Mas e daí? Se optamos por uma beleza natural, é quase óbvio que estamos aceitando a nossa própria beleza, não? A beleza natural funciona, mas requer tempo. E requer aceitação. Informação. Auto-estima.

Essa frustração fruto da pressa cria uma ideia errada de que cosméticos naturais não funcionam. São “coisa” de hippie. Não tem praticidade.

Não me canso de ler comentários de pessoas criticando o desodorante à base de óleo de coco e óleos essenciais devido a funcionalidade “efêmera” – para alguns – da fórmula. Se o seu estilo de vida está em uma cidade que tem altas temperaturas ou no meio do dia você vai à academia, é claro que pode não funcionar tantas horas – aliás, 24, como os desodorantes e antitranspirantes industriais, não vai mesmo. Mas e daí? Reaplica. Ou aceita – sem produtos que nos inibem de transpirar temos a oportunidade de conhecer nosso corpo, nosso cheiro e saber lidar com eles.

Se você quer uma beleza natural e feita em casa, mas não quer levar uma vida mais slow, consciente e simples, alguma coisa pode estar desconectada, não?! – @anaturalissima

Perigo master:  a   s a ú d e!

A sociedade perdeu o hábito de usar os elementos da natureza nos cuidados pessoais. Não é em toda família que tem aquela matriarca que vai indicar os cuidados de usar o limão em uma máscara para pele oleosa, ou lembrar das contraindicações das ervas certas.

Um alimento que provoca alergia ao ser ingerido também pode causar reações ao ser aplicado na pele, que é nosso maior órgão e tudo absorve.

Recentemente em um grupo de sagrado feminino vi o pedido de socorro de uma menina que  acabara de queimar a pele com uma máscara caseira de canela descoberta em um grupo de beleza no Facebook. Ela estava desesperada, e ficou ainda mais ao saber que o ingrediente é alergênico. A pele, ela relatou, estava “avermelhada e ardendo muito!”.

A inofensiva misturinha de aveia, água e açúcar orgânico (aparentemente segura) para esfoliar a face pode ser bem nociva para quem é intolerante a glúten, por exemplo – a aveia aqui no Brasil tem glúten. Donas de peles sensíveis podem não gostar nada da sensação da canela e bicabornato – presente em chás para controlar a oleosidade dos cabelos. Lembro que, nos anos 1990, era febre fazer bronzeadores naturais, com urucum e até folha de chá de figo (alerta perigo. não façam!). São naturais? Totalmente! Mas o chá de figo, por exemplo, provocou queimaduras graves em centenas de pessoas que aderiam. Eu era criança, mas lembro bem dos relatos – minha irmã fez.

Os óleos essenciais, tão presentes nos cosméticos naturais, também tem um universo complexo. Em excesso, podem causar efeito contrário.

Gente, grupo de discussão não é consultório


A sua pele não é a mesma da amiga!

A sua pele não é a mesma da amiga!


Expressões como “use assim”, “faça isso”, “é só misturar isso” estão sempre presentes – nos grupos de WhatsApp, no Facebook   e afins, para mostrar que é fácil e simples. E é. Mas cada pele é uma pele, cada reação é uma reação. Todos são canais maravilhosos – eu tenho até meus preferidos – inclusive para trocas de experiências. Mas é preciso ser mais, bem mais crítico, desconfiado e curioso. Ir além da dica da amiga, sabe? Até porque cada pele reage de uma maneira, seja com reações positivas ou negativas.

Tenho muitos motivos para escrever sobre o porque fazer  cosméticos em casa – eu amo e faço semanalmente. E, na verdade, nenhum para não fazer. Mas caso faça você mesma, faça consciente!

Conversei sobre o tema com duas artesãs de cosméticos naturais: a farmacêutica Mona Soares, professora de saboaria natural e proprietária da marca Ewé Alquimias; e a Fefa Pimenta, graduanda em Farmácia, aromaterapeuta, fitoaromatóloga e fundadora da Fefa Pimenta Natural. Experientes e conscientes, as duas têm considerações importantes e dicas práticas para quem quer seguir a jornada de  fazer o próprio cosmético com segurança e consciência. Confira:

A favor, com parcimônia “Sou completamente a favor do “faça você mesma/o e, justamente por isso, gostaria que houvesse conscientização para que esse conceito crie amplitude e ganhe cada vez mais simpatia, até dos incrédulos. Como reforçar isso com receitas duvidosas e tanta especulação?”, pondera Fefa Pimenta.

Faça cursos e oficinas “Se você quer fazer sua própria receita em casa, busque cursos na área de cosmética natural,  saboaria e aromaterapia para conhecer as substâncias que você irá usar”, sugere Mona Soares.

Receita: cada caso é um caso “Se for seguir uma receita da  internet, procure ver onde o conteúdo foi postado e quem está por trás dele. Quando posto algo do tipo, no final sempre coloco meu currículo (sou farmacêutica)  e um e-mail para tirar  dúvidas. Sou a favor da partilha responsável de conteúdos sobre cosméticos naturais. A diferença entre você fazer uma coisa de forma responsável e irresponsável é a quantidade de conhecimento que você tem”, afirma Mona

Perigo à vista?! “Dependendo dos ativos, podem causar alergias, queimaduras ou até mesmo manchas na pele, por exemplo. Por isso todo cuidado se faz necessário. É sempre recomendável fazer um teste no braço, por exemplo. Não é porque é natural que não causará reações. Cada pessoa é um universo particular”, alerta Fefa.

Ação e reação “Os  alergênicos campeões são a canela, o chocolate e a castanha. Pessoas alérgicas a esses ingredientes geralmente já sabem, e ao ler o rótulo, já evitam adquirir tais produtos. Por isso é importante ter clareza nas informações da composição dos  produtos artesanais, principalmente com relação aos ingredientes alergênicos”, pontua Mona.

Controle de qualidade “Como controlamos a qualidade do alimento que comemos? Da mesma forma devemos proceder com os cosméticos caseiros. Usando nossos próprios sentidos e o bom senso: sabemos que um alimento está estragado pelo cheiro e pela aparência, por exemplo. Cosméticos caseiros devem ser usados sempre frescos, principalmente se a receita levar água. Para evitar a contaminação devemos utilizar recipientes limpos, superfície limpa e higienizar bem as mãos”, analisa Mona.

Validade e armazenamento “O ideal é preparar e usar logo de uma vez”, diz Mona. “Se for conservar, que seja  em recipientes de vidro, com boa vedação e ao abrigo da luz e calor diretos. Dependendo da receita, conservar em geladeira”, completa Fefa.

De onde vem? Devemos buscar fornecedores confiáveis. Pedir laudo da matéria-prima e buscar o máximo de informação para  perceber possíveis adulterações e contaminações. A prática, o estudo e a comparação ajudam muito nesse processo.

Ih, venceu? “O olfato é um bom sinalizador, existe um odor de ranço característico quando usamos somente óleos e manteigas vegetais, por exemplo. Atenção a mudanças bruscas na coloração acompanhada desse odor característico. O ideal é fazer em poucas quantidades e ir renovando conforme a necessidade para não correr esse risco. A validade dependerá dos ingredientes utilizados na receita”, explica Fefa.

Se for para ser natural, que seja com consciência. Por você, pelo planeta, por todas nós.

Seguimos juntas.

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